Pedagogia
Cristina Maria Rosa
A Pedagogia pode ser compreendida,
conceituada, percebida como uma estratégia política? A pedagogia se conforma,
se organiza como “práticas e experiências” que visam ensinar algo? Ela poderia
ser conceituada como “articuladora” de processos educativos? Por haver
múltiplos lugares de aprendizagem ela seria uma das profissões envolvidas em
diferenciados processos educativos? Perguntando de outro modo, padrões de
consumo moldados pela publicidade empresarial podem ser considerados fruto de
políticas educativas? Há uma “pedagogia” para consumo? Neste caso, artefatos midiáticos[1] poderiam
ser produtores de "pedagogias"?
A existência de relações de ensino e
aprendizagem em diferentes nichos sociais regulados pela cultura seria o
imperativo pedagógico contemporâneo? Por ocorrem em vários lugares da cultura e
não apenas na escola, as plurais e diversas mediações que intencionam o ensino
e aprendizagem seriam “pedagogias”?
O novo milênio, recém iniciado e já
finalizando seu primeiro quarto, engendra poucas e nem sempre novas questões
para todos nós, profissionais da educação cujo produto não pode ser conhecido
sem o passar do tempo. A distinção ou pretensa igualdade entre os termos
Pedagogia e seu plural – pedagogias – é uma destas “questões”.
Formação pedagógica
Parte da formação continuada em
qualquer profissão é ler. Sobre a formação, o exercício e os impactos dela na
sociedade. Mas não só...
Pedagoga, há algum tempo tenho me defrontado com o uso – em textos, propostas e comunicações – da expressão Pedagogias.
Ao ler o substantivo Pedagogia
pluralizado, aciono a possibilidade de compreender o termo como sinônimo, entre
outros, de atividades pedagógicas estratégicas ou ferramentas planejadas com o
objetivo de promover o aprendizado. Ou ainda, métodos e processos específicos
para um público selecionado e até proposições dirigidas a níveis ou modalidades
de ensino. Pedagogia, nestes exemplos, seria um modo, um meio, uma fórmula ou
tática, um mecanismo e/ou dispositivo e, até, um artifício ou esquema e até uma
técnica que, uma vez aprendida, ao ser acionada produziria os resultados
desejados.
Neste espectro conceitual, caberia
mencionar as variadas e consolidadas proposições teóricas e metodológicas que
ao fim do século XIX e durante todo o XX, deram margem e até mesmo engendraram
o uso do vocábulo “pedagogias”: as tendências pedagógicas. Estas, de orientação
liberal ou progressista, assumiram para si e como suas, a totalidade da
profissão, especialmente em escolas. Ao me convencer de suas verdades, teria
havido, durante todo esse tempo, a formação de docentes (pedagogos e pedagogas,
em especial), para o exercício de uma educação liberal e, em seu oposto, para
uma educação progressista, cada uma delas fracionada por categorias mais ou
menos conservadoras ou libertárias. Penso que a concomitância dessas
abordagens, poderia, sim, ter dado impulso ao uso do termo pedagogia em sua
flexão de número: pedagogias.
Mais recentemente, expressões como
pedagogias ativas (incentivado a participar ativamente da construção do
conhecimento com foco na autonomia, criatividade e protagonismo, nesta
abordagem o educando é centro do processo de aprendizagem), pedagogias renovadas
– cujo foco é a adaptação a exigências da sociedade globalizada do conhecimento
– e pedagogias culturais – invenção originada na ampliação da noção de lugares
de aprendizagem e de processos educativos que extrapolam o âmbito escolar – têm
sido mencionadas
Pedagogia
Quase uma sinédoque – recurso
estilístico que se serve da figura de linguagem para substituir uma palavra por
outra pela proximidade de sentidos entre ambas – em raras publicações sobre
esses termos a Pedagogia, como profissão, é conceituada. Aproveitando-se da
compreensão generalizada, do senso comum sobre parte dos saberes que circulam
sobre essa profissionalidade – a profissão e seu exercício em sociedade –
usuários do termo “pedagogias” ignoram ou fazem questão de não mencionar que a
Pedagogia é um campo da ciência que estuda o ensino e a aprendizagem. Envolve a
compreensão de como as pessoas aprendem, como as diferenciadas gerações dão
sentido e significado ao conhecimento, à cultura, às relações éticas e
políticas.
Área de estudo focada na educação e
no desenvolvimento humano, a Pedagogia intenciona compreender fenômenos
educativos em larga escala e também individualmente, uma vez que a aprendizagem
de cada um é fundamental para a vida em sociedade. É por sua importância na
vida individual e de pequenos grupos assim como na dos demais, que há tantas
modalidades de educação no país.
A Pedagogia, também, é capaz de
indicar quais os mais eficientes e eficazes modos de uma nação obter, via
processos de estudo, pesquisa, organização metodológica e publicização de
saberes, as aprendizagens essenciais, as habilidades e as competências que
todos têm o direito de ter, mobilizar, usufruir.
Por estar assentada sobre áreas
consistentes de pesquisa – psicologia, linguagem, sociologia, história,
política e ciências, entre outras – e ser integrada por suas descobertas e
consensos, a Pedagogia oportuniza olhar para processos de ensino e de aprendizagem
a partir de diferentes perspectivas. Apesar de ter como imperativo profissional
responder socialmente pelas aprendizagens essenciais circunscritas por
conhecimentos, habilidades, atitudes e valores que devem ser mobilizados,
articulados e integrados pelos “sujeitos educados”, a Pedagogia extrapola o
“fazer”.
Por sonhar, desejar, investir em uma
sociedade que tenha como princípio a liberdade e tenha como ideal a
solidariedade humana, a Pedagogia pode e deve ser pautada pela igualdade de
acesso e permanência de todos em processos educativos. Através da defesa de um
utópico pluralismo de ideias, a Pedagogia indica ter apreço à tolerância e respeito
à diversidade, pluralidade e liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e
divulgar saberes. Em busca de um padrão
de qualidade de aprendizagem e ensino, mas, também, de acesso a processos
educativos e suas variadas consequências, a Pedagogia importa-se com o eu, o
nós e o outro.
Ao desejar, desde tenra idade, que
todos façamos parte de uma educação ao longo da vida, ou seja, que todos
sejamos aprendizes e ensinantes do que temos de melhor em busca do sermos
capazes de contribuir com a sociedade de forma significativa, produtiva, ética,
priorizando o bem comum, a Pedagogia se insere e se pauta nos ideais e
princípios da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, uma conquista de
toda nação. Inspirada em princípios, a
Pedagogia como campo de formação de profissionais tem por finalidade o pleno
desenvolvimento humano, o exercício da cidadania e a qualificação para o
trabalho.
Pedagogias e seus quetais...
A Pedagogia, por se ocupar com
habilidades e competências necessárias para que todos se desenvolvam de forma a
que tenham condições e oportunidades de contribuir para a sociedade, tem sido
confundida.
Confundida com métodos, processos,
artimanhas e estratégias.
Sim, há métodos, na Pedagogia.
E sim, há processos, artimanhas e
estratégias no fazer pedagógico.
Sim, não se pode negar que a
Pedagogia oferece a professores, gestores e a outros profissionais não
tecnicamente habilitados para os processos formais do educar, ferramentas e
técnicas que tem como intuito melhorar a qualidade dos procedimentos de aquisição
de saberes não apenas formais, escolares, listados em diretrizes, bases e
parâmetros. A Pedagogia tem o bom hábito de não escolher destinatários: ela é
pública e de qualidade e não se nega a promover o desenvolvimento de
habilidades educacionais amplas que possam vir a ser generalizadas.
E, com certeza, o conhecimento
produzido pela Pedagogia, apesar de peculiar por todos os seus atributos como
campo de saber que extrapola mas não prescinde do fazer, pode vir a ser
aplicado para melhorar outros e variados “métodos”.
Intencionalmente criados para os
processos que ocorrem na escola – maior e mais consistente local de convivência
desde tenra idade no Brasil – os modos de ser e estar pedagógicos se relacionam
mais intimamente de que conseguimos supor com o projeto de nação que temos.
Individualmente e como país. Esses “modos de ser e estar”, no entanto, são
autorizados, cerificados, diplomados.
Instituições pluridisciplinares de
formação dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão
e de domínio e cultivo do saber humano, as Universidades brasileiras se
caracterizam pela produção intelectual institucionalizada mediante o estudo
sistemático dos temas e problemas mais relevantes, tanto do ponto de vista
científico e cultural, quanto regional e nacional.
Assim, é nela, a Universidade, que a
Pedagogia é tratada. Comprometida com todas as leis que regem e normatizam a
educação escolar no país, seus currículos são reavaliados sistematicamente,
seus egressos são experimentados nos diferenciados locais de trabalho e seus
efeitos são conhecidos em graus e níveis de escolaridade, domínio de saberes e
usufruto da cultura no sentido amplo. Não há nenhuma outra profissão que
abranja tantos processos, tantas pessoas, tanta importância, pois não há um só
pesquisador ou profissional técnico e tecnológico “de ponta”, em qualquer outra
profissão, que não tenha aprendido a ler e escrever.
Finalizando...
Em um texto intitulado Discursos sobrte o profissionalismo docente: paradoxos e alternativas conceptuais, Maria Assunção Flores indica que "mudanças sociais, culturais e políticas têm tido repercussões no trabalho" de professores de uma maneira geral. Entre elas, "maior ceticismo em relação à sua autoridade, uma cultura consumista e transformações nas tecnologias de informação e comunicação". A autora, porém, observa que, apesar disso, "os professores têm respondido de diferentes modos a esses desafios em diversos contextos, com implicações ao nível do profissionalismo docente e das suas identidades profissionais".
Nesta mesma linha e finalizando, penso que, embora muitas vezes seja associada à prática de algum ensino, a Pedagogia é uma forma de pensamento e linguagem, atitude e intervenção, sonho e realidade que, em contraste com as demais já experimentadas e convivendo com a pluralidade de todas elas, se oferece como base para a educação na vida das pessoas em sociedade.
Saber mais...
Para saber mais de Maria Assunção Flores leia Discursos sobrte o profissionalismo docente: paradoxos e alternativas conceptuais. Disponível em: https//www.scielo.br/j/rbedu/a/nRWmGDz4XZ6zZWSzpV5VWLS/
[1] Produtos ou
elementos criados e disseminados por meio de diferenciadas plataformas como
jornais, rádio, televisão, revista e internet, artefatos midiáticos são textos,
imagens, áudios, vídeos, animações, infográficos ou outros, criados para
entretenimento, educação, publicidade, informação e/ou outras finalidades.
Podem desempenhar papel importante na forma como consumimos e interagimos com a
informação e a cultura.