07 de janeiro: um
dia para o leitor
Cristina Maria Rosa
É possível ensinar a gostar de ler? Há um método para ensinar a gostar
de ler? E, crianças pequenas, antes de lerem as letras e suas combinações,
podem aprender a gostar de ler?
Os métodos para ensinar a gostar de ler são ensinados/aprendidos na
Licenciatura em Pedagogia. Lá, entre professores que leem e ensinam o que é um
livro de qualidade, cada futuro professor pode aprimorar seu gosto. Adquirir um
acervo para sustentar literariamente seu projeto docente também é muito
importante, pois um Pedagogo é um “mediador”, um indivíduo que estende pontes
entre quem deseja saber e o que já se sabe. Mas pode criar “pontes outras”,
pois sempre queremos saber mais.
As crianças...
Para herdarem os saberes da cultura escrita que uma família possui, as
crianças precisam ser convidadas a admirar o que há nos livros, na leitura e
nas maneiras como os adultos leem e conservam suas bibliotecas.
Na escola, também é assim: para que as crianças utilizem e usufruam da
biblioteca, precisam saber onde é, como funciona, quais as obras que existem
em seu acervo, como é possível ler estras obras e como cuidar delas para que
as demais crianças que ali estudarem, também possam conhecê-las.
É assim que, dia após dia, o hábito e o gosto vão sendo lapidados, pois processos
espontâneos nem sempre resultam em leitores. Rotinas e procedimentos
organizados, aprofundados e metódicos são os mais adequados para inserir um
novo leitor no miundo da cultura escrita. Letramento é esse processo: inserir e
dar continuidade a uma formação leitora.
Ter um método de ensino torna o exercício da profissão docente mais
intensamente capaz de objetivar desejos e intenções. No ensino do gostar de
ler, o método – a mediação literária – agrega valor ao artefato cultural – o
livro e seus atributos – e não pode prescindir de planejamento, desenvolvimento
e avaliação.
O que é Leitura?
A leitura é um fenômeno que
ocorre em quatro dimensões: anterior à decodificação do sistema de escrita
alfabético, concomitante a sua aprendizagem e posterior a suas descobertas. É
ainda, um fenômeno de dimensão imensurável, inimaginável e magnífico,
especialmente pela sua capacidade inventiva.
Leitura: um fenômeno
em quatro dimensões
Entendo a leitura como um
fenômeno que extrapola os sujeitos em relação (autor, texto e leitor), não
restrita ao ato de decodificar letras, sílabas e construções
frasais utilizados em gêneros textuais dos mais diversos tipos.
Para mim, a leitura não é circunscrita ao
ato de relacionar sons e sinais gráficos inventados historicamente pela
humanidade, capazes de produzir compreensão, interpretação, conotação ou
suposição de intenções.
Antes, o que há?
A
leitura antecede a primeira relação preconizada na escola –
compreender o sistema alfabético, suas regras e manifestações. E, por isso, é
um fenômeno e não apenas uma habilidade.
E argumento: ao nascer em
uma sociedade leitora, cada humano recebe, desta e como herança cultural a ser
apreendida – incorporada, cultuada, rejeitada, acentuada, ampliada ou
simplesmente ignorada –, um rol de saberes sobre o que é, qual a importância,
valor e função da escrita e como é possível conhecê-la e
utilizá-la. Assim, pode ser entendida como um fenômeno
cultural que ocorre no tempo – na história de cada de leitor – e no
espaço, geográfico, mas também social, para o qual concorrem muitos elementos.
As quatro dimensões...
A leitura é um fenômeno que
ocorre em quatro dimensões: anterior, concomitante e posterior ao ato
de decodificar e que produz a quarta dimensão, a inventiva. Produzida pelo
sentido profundo do ler o escrito, a dimensão inventiva é mais difícil de
ser observada, mas oferece indícios quando das comunicações orais ou escritas
(discursos, uso do léxico, composições e elucubrações) por seus usuários.
1. A leitura é um
fenômeno anterior à
compreensão do sistema de escrita alfabético justamente pelos saberes que
circulam acerca do valor social da leitura. Assim, é possível afirmar que é uma
faculdade a ser adquirida. E é uma capacidade que ocorre processualmente, por
toda a vida que antecede o conhecimento de letras e suas combinações. Posso
afirmar que esses saberes prévios antecipam, aprimorando ou prejudicando a
compreensão do sistema alfabético.
2. A leitura é um
fenômeno concomitante à
compreensão do sistema de escrita alfabético exatamente por que, enquanto se lê
é que ocorre a compreensão da escrita em si, seu valor gramatical, gráfico,
correspondente, representativo, posicional e conceitual. Conhecer e compreender
o sistema de escrita alfabética é condição para a leitura, mas não se restringe
a ela.
3. A leitura é um fenômeno posterior, pelo poder que possui de
reverberar sentidos e significados na vida do leitor.
E é um fenômeno que
produz uma dimensão
imensurável – a inventiva – quando do contato com a escrita literária,
uma vez que esta agrega ao produto da escrita convencional, o valor da arte do
escrito.
Para Arthur Schopenhauer,
“a experiência pessoal é a condição indispensável, necessária para a
compreensão tanto da poesia quanto da história, pois é, por assim dizer, o
dicionário da língua falada por ambas” (Metafísica do Belo. UNESP, 2003, p.
205).