Teclado
Cristina Maria Rosa
No teclado que escrevo, em Torino, não há í, ê, ões, á, ão, â, ú.
Deve não haver mais uma quantidades de outras letras ou sílabas que ainda precisarei para escrever mas, o desespero é tão grande diante da falta que “criei” uma solução: eu colo. E inventei dois jeitos de colar: um, clássico, o famoso “copia a cola”. O procedimento é assim: procuro um domento qualquer (um texto meu, de preferência cheio de expressões) e insiro no novo texto a ser escrito. Ali, com certeza, tem uma variedade de letras acentuadas…
Na urgência de escrever e ao não encontrar, envio a mim mesma pelo whattsapp, a letra faltante. Esse o segundo pocedimento. Inventei hoje.
Por fim, para escrever palavras ou expressões em italiano que considero importantes no texto, consulto duas gramáticas e um dicionário que me foi entregue logo que cheguei. Coincidentemente quando meu italiano - ao escrever - se mostrou frágil. Eu diria tosco, mas a elegância não permite.
Na vida real, um “buongiorno” abre portas. Um “grazie”, mais um “prego”, ajudam muito. Uma “buona serata” quase sempre resolve. Se for acompanhada de um sorriso, cada uma dessas expressões torna uma saída de casa possível.
Além das gramáticas e dicionário, repito - quando a comunicação é pelo telefone -, parte da pergunta antes de responder. Assim, se quem quer saber é beeeeemmm curioso, quase sempre já envia, ao questionar, a estrutura da língua e um léxico que a aprendiz aqui, ainda não dispõe. Pronto! Me organizo, copio e colo, acrescento um grazie e…
Avanti!
Escrever em um teclado organizado em outra língua deveria ser um método de ensino. Fico encantada com a possibilidade de ser corrigida sem que ninguém saiba que errei e, logo depois, como um jogo em que sou desafiada, tento acertar.
Nunca pensei sobre isso, mas estou bem tentada a adquirir um teclado para estudar italiano. Como sempre lembro de todos os meus professores de italiano (três mulheres e um homem) que, unânimes, mencionaram a dificuldade como incentivo, penso que, para a escrita, o teclado será meu novo professor.
Quanto às atitudes (saudações, pedidos nos cafés ou sorveterias, compras na floricultura, medicamenos na farmácia), uso, também, o copia/cola. Como? Ouço. Se dizem buongiorno ou buona serata, repito. Se pedem pasta fresca, que adoro, imito. Nunca se erra, desse jeito.
No supermercado, como estratégia, pedi ajuda para escolher uma "melhor marca de". Era de molho pesto, um clássico italiano. Ao chegar em casa e inserir esse sabor à minha pasta fresca, ri.
Outra “cola” que inventei foi espiar, discretamente, o conteúdo dos cestos em compras. Meu foco era, a partir das escolhas de outros, encontrar marcas de produtos que merecem ir para a casa das italianas que preparam um jantar, por exemplo.
Deu certo!
Já preparei alguns pratos que não fazia ideia que poderiam ter sabor tão especial.
Na volta, te ensino.
Sozinha por alguns dias, estou me descobrindo uma flaneur. Um termo chique que inventaram para descrever curiosos que andam, para lá e para cá, quase sem fazer nada. A Antropologia acrecentou um glamour quando disse que este sujeito, o flaneur, era, ou poderia ser, um exímio observador do cotidiano. Em italino seria um passeggiatore svagato e a momenti curioso.
Pois, então.
Eventualmente, me sinto assim.
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