Critérios para a Alfabetização Literária
Cristina Maria Rosa
Há obras
literárias indicadas a serem lidas para bebês entre zero e quatro anos? Se sim, como as escolher? Quais os critérios que indicam obras para essa idade geracional?
A primeira infância é uma fase muito importante
para o crescimento da criança e, quanto melhores forem, as circunstâncias de vida
durante este período, maiores serão as probabilidades de que ela se torne um
adulto mais equilibrado, produtivo e realizado.
A alfabetização literária pode
ser entendida como um processo de “apresentação da literatura a todos” e,
de acordo com ROSA (2019), significa que a formação do gosto por ler literatura
é um processo que não pode ser aleatório, eventual e desprovido de critérios.
Para Debus (2015), os critérios de seleção de livros literários
destinados a crianças “levam em
consideração, na maioria das vezes, os estágios de desenvolvimento infantil,
obedecendo à faixa etária ou à faixa escolar do leitor”. A pesquisadora
informa que, quando se trata de crianças pequenas, entre zero e seis anos de
idade, “existem algumas especificidades
nos critérios que orientam o acesso e a escolha dos livros” e que eles são
importantes por dois motivos: a maior parte das crianças ainda não está no
espaço escolar e é uma leitora em formação.
Para Abramovich (1997), a literatura tem linguagem fluida e aborda os
problemas de modo discursivo e indica critérios a serem adotados quando da
escolha de obras, entre eles, ter como princípio que a formação do leitor
inicia pela audição de muitas histórias, escolher inicialmente histórias curtas
e bem humoradas, inteligentes, criativas, que surpreendem e investir na escolha
de obras a serem lidas pelos leitores, observar de forma crítica como os
personagens são representados nas ilustrações, especialmente os pobres, as
mulheres, os indígenas, japoneses e negros, as mães, tias e professoras. Além
disso, considera importante priorizar a presença de humor, o deboche saudável,
a ironia, o nonsense, a presença de personagens nada comuns e preferir obras
com presença da lógica da criança. Abramovich também argumenta pela inserção da
poesia “boa, bem escrita, que mexe com a
emoção, que nos aguça, que nos deixa um pouco diferente depois de cada verso”, propor
obras que oferecem informação e verdade, pois “entender o processo de como nascemos até quando morremos faz parte
natural da curiosidade da criança” e ler
integralmente os “Contos de Fadas”
pela abordagem do amor em todos os seus prismas: descoberta, encanto,
possibilidade, entrega, plenitude, sofrimento, angústia, injustiça, tristeza,
obstáculos, dúvidas, identidade, rejeição, perdas, esquecimentos, revelações de
sexualidade, da vida e da morte.
Para Nelly Novaes Coelho (1993) a categoria leitora está vinculada a
três fatores: “idade cronológica, nível
de amadurecimento biopsíquico-afetivo-intelectual e grau ou nível de
conhecimento/domínio do mecanismo da leitura”. Assim, indica compor um
acervo a partir da seguinte divisão: 1) pré-leitor (primeira infância que
inclui bebês dos 15/17 meses aos 3 anos e, segunda infância, com crianças a
partir dos 2/3 anos); 2) Leitor iniciante ou crianças a partir dos 6/7 anos; 3)
Leitor em processo ou crianças a partir dos 8/9 anos; 4) leitor fluente ou
criança a partir dos 10/11 anos e 5) leitor crítico, já um pré-adolescente a
partir dos 12/13 anos.
Para Maria Betty Coelho Silva (1991), devem ser respeitadas as
peculiaridades e os estágios emocionais das crianças na escolha dos livros. “Alimento da imaginação”, as histórias
precisam respeitar a “estrutura cerebral”
infantil. A autora faz um quadro demonstrativo de interesses, no qual divide os
leitores em pré-escolares e escolares. E divide os pré-escolares em duas fases:
a pré-mágica (crianças até três anos) e a mágica (crianças de três a seis
anos). Aconselha para os primeiros, histórias de bichinhos, brinquedos,
objetos, seres da natureza (humanizados), história de crianças. Para os demais,
histórias de repetição e acumulativas, além de histórias de fadas.
Leitores do Século XXI
Pouco estudados no século XX, esse grupo de leitores em formação (bebês em sua maioria não escolarizados) eram pouco visados pelas políticas públicas e pela indústria do livro. O comum é que Editoras criassem brinquedos que imitavam livros como os de pano, de borracha, de plástico e outros materiais resistentes ao tato, ao gosto, à água, à falta de traquejo das mãos infantis. Em fins do século XX e início do XXI, a presença intensa de bebês nos berçários e escolas infantis desencadeou estudos com o intuito de prescrever quais seriam os livros que poderiam ser utilizados na alfabetização literária dessas crianças. Para Abramovich (1989), Coelho (1993) e Silva (1991), deveriam ser livros lidos por adultos para as crianças, ilustrados, bem humorados, poéticos. E deveriam conter histórias sobre bichos, brinquedos, objetos, seres da natureza, histórias de repetição e acumulativas. Obras com predomínio da fantasia como contos de fadas, mitos, lendas e fábulas e atitudes como o desenvolvimento da apreciação critica da leitura são recomendados. Pouco texto, muita gravura, cor e, em alguns casos, sons também foram sugeridos e apareceram no mercado. Livros de panos, livros-brinquedos e somente de imagens aparecem com frequência nos catálogos de Editoras, indicando que o mercado é eficaz em enganar o consumidor.
Rosa (2019) argumenta que a criança pequena não pode ser subestimada e
sugere que a leitura pode ter início assim que ela ficar ereta, sentada no colo
do adulto, na cadeirinha ou no “bebê-conforto”.
Para tal, o leitor (mãe, irmão mais velho, professora, cuidadora) deve escolher
um excelente texto que pode ou não ser ilustrado. A autora defende que durante
a leitura do texto escolhido, o som da voz e os ritos da leitura (escolher,
abrir folhear, indicar imagens, fechar, guardar) são formadores desse leitor em
potencial, tornando a leitura “de
verdade” e não apenas imitação ou distração. Para a autora, o livro não é
um brinquedo: é o artefato mais importante da cultura escrita e a leitura seus
atributos e sentidos podem ser adquiridos desde tenra idade.
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