Infância em
livros na Dom Quixote Bento Gonçalves.
Cristina Maria
Rosa
Na quarta-feira, dia 21 de outubro, por
duas horas, estive na Dom Quixote, uma livraria charmosa que existe em Bento. Estrategicamente
localizada em uma rua de amplo fluxo, lugar repleto de consultórios médicos,
cafés, estacionamentos e “esperas”, a livraria é também sebo e café, além de
estar integrada a eventos ligados ao mundo do livro e da leitura como feiras,
sessões de autógrafos e diálogos com autores.
Meu intuito era conhecer o acervo
dedicado às crianças. Nele, meu foco era localizar, ler e adquirir obras que pudessem
ser indicadas a Professoras, Pedagogas, Bibliotecárias e Gestoras escolares que
desejem conhecer, abordar e se tornar letradas em direitos das crianças que, no
Brasil, estão garantidos no Estatuto da Criança e do Adolescente. Os títulos
que pretendo reunir em uma lista, devem ter sido publicados a partir de 1990,
ano do decreto e sancionamento da Lei 8.069, de 13 de julho de 1990, conhecida
como ECA.
Dom Quixote Livraria & Cafeteria
Livraria é uma raridade na Serra
Gaúcha.
Infelizmente.
Na “capital” do vinho, a Dom Quixote
“combina” com o nome. Resiste bravamente à desilusão. Como “armas” em sua
cruzada, é plena de livros – usados e novos, próprios e consignados – sem se descuidar
das futuras gerações: o setor infantil, embora bem pequeno se comparado ao espaço
tomado pelos demais livros, é bem fornido. No acervo com em torno de 900
títulos, encontrei até uma raridade: A festa das letras, de Cecília Meireles
e Josué de Castro, originalmente publicado em 1937. Se não sabes por que este livro
é raro, leia sobre em: http://crisalfabetoaparte.blogspot.com/2014/01/1948-o-batalhao-das-letras-de-quintana.html.
Entrevistando o homem do casal de proprietários,
descobri que há clientes fiéis, bons contatos com Editoras (em especial, duas),
uma relação cultivada com o público e orgulho de ter bons títulos no acervo. O
café, inserido na rotina como um odor necessário e bem-vindo, oferece apenas
duas mesas com dois assentos cada. Suficiente para o meu estudo. E para os
clientes que durante as duas horas em que ali estive, circularam por lá. “Uma
água, um pingado e uma fatia de bolo”, “dois expressos”, “dois sucos”, “uma
água e um expresso”. Esses os pedidos dos demais que, como eu, ali entraram
entre as 13 e as 15 horas de quarta-feira, dia 26 de outubro de 2022. Tomam um
cafezinho, espiam um livro ou outro, perguntam por algum título, batem um
papinho e saem. Alguns vem focados: adquirem e saem.
Conversando com uma das atendentes,
descobri que a Dom já foi grande (em torno de 100 metros quadrados) e
nela havia muito espaço para estudar, o que era comum até entre jovens frequentadores.
Mas, de acordo com ela, os clientes gostam muito da nova configuração: pequena,
acolhedora, suficiente.
Tradição entre os gaúchos – “frequentar”
uma livraria “de calçada” – não é bem o que ocorre ali. O espaço é bem pequeno,
tem apenas duas grandes e repletas paredes com livros em toda a extensão, tanto
longitudinal como transversalmente. No meio, entre os dois espaços destinados a
tomar um café, há uma estante menor, também com livros. Percebo agora que dei
pouca importância a este espaço. Vou ter que voltar lá. Ao fundo, o caixa, uma pequena
cozinha onde são preparados os cafés e um banheiro bem cuidado.
O que interessa, na Dom, no meu
entender, é o acervo. E, a possibilidade de ali estudar, herdada, talvez, de
tempos idos. Eu fui bem recebida, me permitiram ler e manipular livros e pude
conversar abertamente sobre o que é qualidade literária e editorial. Te
surpreende? A mim também.
Pesquisando...
Meu propósito, já conheces. Conhecer
o acervo em termos de quantidade e qualidade. O literário desse acervo é minha
maior curiosidade pois, sim, há muitos livros sendo produzidos que se
restringem ao desejo de "educar" o leitor, seja lá que a que educação
se referem.
Me interessa também e muito, ver se
há autores brasileiros, mais especialmente do Rio Grande do Sul, entre os
títulos expostos. Encontrei, entre os 156 títulos observados, apenas dois aqui
do Sul: Caio Riter (Sete patinhos na Lagoa, da Biruta, 2012) e Carlos Urbim (Dever
de casa, da Projeto, 2011).
E encontrei alguns de André Neves, que
nasceu no Recife e é radicado em Porto Alegre. É dele o melhor título que
encontrei no acervo da Dom: Obrigado. Narrativa poética que reúne poemas
verbais e visuais, apresenta poetas que marcaram sua trajetória de vida e o constituíram
leitor, ilustrador e escritor. Premiado, maduro, Neves revela delicadezas sobre
o processo de criação deste maravilhoso livro em uma entrevista à Revista
Crescer. Quer ler? Clique em: https://revistacrescer.globo.com/Entretenimento/noticia/2020/09/andre-neves-e-o-lugar-da-poesia-na-infancia.html.
Quer conhecer o escritor? Veja em: https://www.bing.com/videos/search?q=andr%c3%a9+neves+vive+em&docid=608019197549297549&mid=27964EB61F66D3F5D83B27964EB61F66D3F5D83B&view=detail&FORM=VIRE.
Atitudes e números desta visita...
Após a observação do espaço ocupado
pelo acervo total da livraria (oito colunas em cada lado e 10 separações
transversais em cada uma), contei quantos livros havia em uma parte de uma das
estantes e multipliquei por todas para obter um valor aproximado de títulos.
Quase não há duplicação de títulos na livraria, o que ajudou o resultado do
cálculo a ser mais preciso.
Depois, comparei o espaço ocupado por livros no local restrito a crianças. Neste caso, a relação foi de 16 para um, ou seja, o espaço infantil é uma parte do total de 17 “estantes” da livraria. Para ser mais precisa, contei, manualmente, todos os títulos em uma das partes na estante do setor infantil. Por fim, multiplicando pelas demais, deduzi que ali se encontrava a quantidade aproximada de 600 títulos. Tanto a atendente quanto o proprietário declararam não saber o número de títulos disponíveis e ambos mencionaram estar desfalcado o acervo, em função das atividades fora da livraria (feiras do livro) que mobilizam parte considerável dos livros.
Primeira seleção
Organizei um espaço para separar (reservar para ler e descartar os
que não leria). Nesta primeira escolha, 20 foram para a mesinha de café e 53
foram deixados na estante. Assim, percorri o olhar sobre 73 primeiros títulos. Me
desloquei para a mesa e, diante dos 20 “separados para leitura”, fotografei
todas as capas, li 18 e fotografei mais alguns detalhes dos que, entre eles, mais
gostei. Dois desse grupo – Quem sou eu?, de Ana Maria Machado e O
coelho, o escuro e a lata de biscoitos, de Nicola O’Byrne (Brinque-Book,
2021 – não pude ler: estavam envolvidos em papel filme e o proprietário não permitiu
abrir.
Quatro destaques desta primeira
seleção: Obrigado, de André Neves (Editora Pulo do Gato, 2021), Lua
noite e dia, de André Neves (Paulinas, 2019), Pedro e Tina: uma amizade
muito especial, de Stephen Michael King (Brinque-Book, 2015) e Diversidade,
de Tatiana Belinky, editado pela Editora Quinteto, em 1999 e reeditado pela FTD,
em 2015. Nesta obra, em versos que primam pela rima, a autora “argumenta” que
não basta reconhecer diferenças nos aspectos físicos, comportamentais ou de personalidade.
É preciso respeitá-las. Cor da pele, textura do cabelo, humor ou temperamento
são fatores de diversidade e não tornam as pessoas melhores ou piores, mas
diferentes, como todos os seres humanos, de acordo com Belinky (1999). Todos os
quatro ficaram depositados na mesa, para a decisão final: adquirir?
Segunda seleção
Entre os 47 títulos observados nessa
segunda investida no acervo, escolhi 10 e os demais 37 foram deixados na
estante. Diante dos 10 “separados para leitura”, fotografei todas as capas, li todos
e selecionei quatro: Vira lata, de Stephen Michael King (Brinque-Book,
2015); Ismael e Chopin, de Miguel Souza Tavares Companhia das Letrinhas,
2011); Os direitos das crianças segundo Ruth Rocha (Companhia das Letras,
2002 e Salamandra, 2014) e Grandes mulheres que fizeram história, de
Kate Pankhurst (Editora Vergara & Riba, 2018). Este último, destaca-se por abordar a igualdade
de gênero, a presença e a importância de mulheres na história e o empreendedorismo
feminino.
Terceira seleção:
Por fim, selecionei mais 7 entre 36
títulos, todos da mesma e parte da estante do setor infantil. Diante deles e
sentada apreciando cada um, fotografei todos e alguns detalhes de alguns, como
introdução e última capa, por exemplo e destaquei para ler de novo, ao fim, apenas
um: Não me toca, seu boboca, de Andrea Viviana Taubman (Aletria,
2021). Não que outros não fossem interessantes, apenas não de adequavam a minha
busca temática.
Fim da "visita"
Ao sair da Dom Quixote – eram 15
horas e trinta minutos de uma quarta-feira – eu me encontrava feliz da vida!
Tinha conseguido ler 37 livros.
Alguns integram minha biblioteca e, mesmo
assim, os reli.
Nos meus braços, embalados na sacola
com os dizeres “Juntos fazemos o moinho da vida girar. Aprecie sua leitura”, da
Dom Quixote livraria & Cafeteria, dois títulos: Ismael e Chopin, de
Miguel Souza Tavares e Os direitos das crianças segundo Ruth Rocha.
O primeiro, adquiri por ser desconhecido.
Ao ler uma parte, me apaixonei. Já estou lendo e, depois te conto tudo. O
segundo, por motivos óbvios: trata dos direitos das crianças segundo uma grande
autora de obras para a infância. Já possuía, mas comprei por ter sido publicado
por outra Editora doze anos após a anterior.
Após entrar em contato com 156 títulos
(26% ou quase um terço do acervo da livraria), tendo lido 37 destes (23,71%), consegui
indicar nove livros a integrem minha lista de obras possíveis e adequadas a
abordarem os direitos das crianças contidos no ECA. Considero que tenha sido
uma excelente tarde de pesquisa!
Mais...
Para conhecer a Dom, clique em https://pt-br.facebook.com/dom.quixote.livraria.cafeteria/
Para saber mais sobre Obrigado,
de André Neves clique em: https://ambrosia.com.br/infantil/obrigado-de-andre-neves-conta-em-poesia-a-infancia-de-grandes-poetas-brasileiros/