Literatura: ser o que se é...
Cristina Maria Rosa
A literatura é uma arte.
Para quem escreve e para quem frui.
A literatura é um fenômeno da criatividade, para Nelly Novaes Coelho
(1991).
É um direito ainda não escrito, para Bartolomeu Campos de Queirós.
É a Literatura que nos faz humanos e só a ficção nos salva, disse Tzvetan
Todorov (2013) em entrevista a Bruno Garcia (2013).
A literatura integra a cultura escrita, uma de nossas maiores conquistas
antropológicas, escreveu ROSA (2017).
A literatura é uma experiência estética, cujo resultado seu criador
quer fazer único e inconfundível, com marcas que ele gostaria que fossem
percebidas pelo leitor como pegadas no caminho da leitura, de acordo com Maria Antonieta
Antunes Cunha (2014).
A literatura pressupõe assumir que a linguagem é uma “faculdade
cognitiva exclusiva da espécie humana que permite a cada indivíduo representar
e expressar simbolicamente sua experiência de vida” (BAGNO, 2014, p. 192).
A literatura é uma das formas de produzir sentido e pode ser conceituada
como “um fenômeno social, uma forma de ação e de interação social”. Assim,
“produzir um texto significa dizer algo a alguém, por algum motivo, de algum
modo, em determinada situação” (FIAD & VAL, 2014, p. 264).
A literatura exige um “leitor proficiente”, aquele que não só
“decodifica as palavras que compõem o texto escrito”, mas, também, “constrói
sentidos de acordo com as condições de funcionamento do gênero em foco”. Para
tal, mobiliza “um conjunto de saberes sobre a língua”, representado por “outros
textos, o gênero textual, o assunto focalizado, o autor do texto, o suporte e
os modos de leitura”, de acordo com Da Mata (2014, p. 165).
A literatura e sua fruição demandam um experiente da espécie que,
ao exercer o ofício de mediador, “crie as condições para fazer com que seja
possível que um livro e um leitor se encontrem”, em “rituais, momentos e
atmosferas propícias” (REYES, 2014, p.213).
A leitura de literatura oportuniza o contato com o texto literário que,
apesar do tempo e do mediador, mantém-se inalterado, com o léxico, a estrutura
textual e as escolhas poéticas, filosóficas, éticas – todas – do autor. Neste
caso, é preservada a experiência estética com o texto
produzido, única para cada sujeito leitor ou ouvinte, para Cristina Maria Rosa
(2017)
A literatura é uma experiência estética literária como a soma da
percepção/apreensão inicial de uma criação literária e das muitas reações
(emocionais, intelectuais ou outras) que esta suscita (...) para Maria Antonieta
Antunes Cunha (2014).
A leitura de literatura é um “modo muito singular
de construir sentidos”. Oportuniza uma “intensidade” de interação com “a
palavra que é só palavra” e uma experiência “libertária de ser e viver”, de
acordo com Rildo Cosson (2014, p. 185).
A escrita literária tem três características
fundamentais: “ela é coisa na/da linguagem, aquilo que na/da linguagem não é
discurso, mas silêncio”, a escrita ou a leitura de um texto literário “é uma
actividade que rompe (no sentido violento) o laço social” e, esta ruptura “tem
um alcance e um valor sexuais”, de acordo com Cristina Álvares (2004, p. 1).
A leitura de literatura é uma experiência rigorosamente pessoal
para o leitor quanto a criação é para seu autor Maria Antonieta Antunes Cunha
(2014).
“Prática
cultural de natureza artística”, para Paulino (2014, p. 177), a leitura do
texto literário se diferencia por oportunizar contato com “outros mundos, em
que nascem seres diversos, com suas ações, pensamentos, emoções”.
Nas palavras de
Todorov (2013): “A importância da Literatura não é o método ou teoria coma qual
a estudamos, mas é a própria Literatura. Porque ela fala de nós mesmos, da condição
humana, da nossa sociedade. Ela nos permite compreender melhor o mundo. Quando
lemos um livro, está lá o que é mais importante”.
Ler...
Ler é diferente de contar.
Não é mais, nem menos. É diferente. Na escola, a criança – aprendiz da
espécie humana que através da fala e pela escrita aprende a organizar o
pensamento – acessa, com a audição de histórias lidas, contatos e
aprimoramentos das relações com a cultura escrita, uma de nossas maiores
conquistas antropológicas. Ler para os pequenos desde tenra infância, então, é
inseri-los no que de melhor produzimos como “sapiens”: a escrita autoral ou, um
modo particular de ver/sentir/narrar o mundo e, um bom mediador, dá nome a quem
de direito: ao autor, a autoria; ao mediador, os sentimentos todos que
encontrou ali e quer perpetuar, divulgar, evidenciar.
No texto Experiência e Pobreza, o filósofo Walter
Benjamin (1933), disserta sobre a perda da capacidade de contar histórias – e
de, com elas, dar ensinamentos morais através do intercâmbio de experiências –,
ocasionada pela dissolução dos vínculos familiares e pelo empobrecimento de
experiências comunicáveis da população.
Para concluir...
Gustavo Bernardo
elaborou o seu “conceito de literatura” e o publicou, com outros pesquisadores,
na obra Introdução aos
termos literários, organizada por José Luis JOBIM e publicada pela Editora 34 em 2002.
Leia:
"A ficção, a literatura, fazem mais do que ampliar as nossas
perspectivas, ao mapearem a realidade, anunciando territórios inexplorados e
desconhecidos; a ficção e a literatura nos permitem viver o que de outro modo
talvez não fosse possível, ou seja, nos permitem ser outros (os personagens) e
adquirir, ainda que momentaneamente, a perspectiva destes outros – para,
adiante, termos uma chance de cumprir o primado categórico de todas as éticas,
de tão difícil realização: ser o que se é".
Nota: A entrevista de Todorov pode ser encontrada em: http://www.academia.edu/8584274/Entrevista_com_Tzvetan_Todorov