quarta-feira, 23 de setembro de 2020

Gregos, romanos...

 


Eu tenho uma amiga.

Cujos pais eram semianalfabetos.

Da cidade, o que muda a perspectiva...

Ela ama ler. E quem a incentivou a ler, foi um faxineiro gay que ajudava em sua casa!

Até hoje, disse, tem uma atração muito grande por eles.

Os faxineiros? Perguntei...

– Os gays, Cristina! Por gays, em geral. Ele limpava a casa e contava histórias. Eu adorava! Acho sempre que eles são muito inteligentes! Engraçados e espirituosos!

Como ela sabe que sou fascinada por escrever, completou:

– Podes publicar. Não é segredo.

Então, resolvi perguntar mais: Que interessante: faxineiro familiar... Que tipo de histórias te contava? Ele contava ou lia?

Ela: – As duas coisas. Geralmente era história mesmo. Gregos, romanos...

Eu: – Nunca tinha ouvido falar de "faxineiro do lar". E lembras os livros? Eram dele? Tinhas os teus? Tu tinhas biblioteca?

Eu querendo saber tudo da leitura e a minha amiga lembrando, saudosa...

– Trabalhava com minha mãe e duas tias. Excelente! Quem era muito liberal e o trouxe, bem jovem, para trabalhar foi o meu tio...

Aí, decidiu me conceder atenção:

– Eu tinha livros, mas ele também tinha. Lia muito. Depois me contava.

E, sem mais nem menos, declarou.

– Ele foi assassinado quando eu tinha 14 anos.

– Assassinado? Eu... Nossa! Por ser gay?

– Sim. Horrível não?

Aí lembrei. Na juventude, também conheci uma figura assim. Culto. Gay. Assassinado.

Ela continuou:

– Ele, como todos os gays da época, eram muito discriminados...

E aí...

Aí, minha amiga derramou sua literatura.

Eu?

Eu adoro!

Leia...

– Ele tinha um desafeto, um tal “Sabiá”. Era um criminoso. E o Wilmar era muito forte e brigão. O cara o esfaqueou. Viste como eles têm histórias trágicas? Se os dois namoravam? Não sei. Eu, na época, nem tinha noção disso! Brincava com bonecas! Era jovem. Imagino que vinte e poucos, quando começou... Eu devia ter uns cinco. Seguia ele pela casa... E ele me cuidava e contava histórias, enquanto faxinava!

Só consegui pensar: Imagina: com nome de pássaro e assassino.

E depois:

– Que delicia devia ser seguir Wilmar pelos corredores da casa!

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